A SABEDORIA DO COVEIRO

A SABEDORIA DO COVEIRO 

(Elizeu Cardoso,  APLAC)

Meu amigo é um homem religioso e bondoso, daqueles que fazem questão de indo à nossa cidade, dar uma passadinha no cemitério. Leva flores aos amigos e familiares, e faz orações pelo descanso do falecido, ainda que no portão principal esteja escrito “descance”. 

Da última vez em que por lá esteve, finalizava um Pai Nosso, quando avistou o coveiro passando lá no fundo. Lembrou-se que precisava de uma reforma urgente no túmulo do avô, e aquele era o momento de pedir um orçamento. Levantou-se apressado e tentou acompanhar o homem à sua frente, que também é pedreiro. Um verdadeiro factótum no mundo dos vivos, pelos mortos! Enterra, reboca, passa cal, e se duvidar ainda arranha um latim ou um aramaico.

A primeira vez chamou baixo, a segunda alto, a terceira e a quarta mais alto ainda. Logo deduziu: O coveiro deve ser surdo... Prevendo a direção em que o homem ia, decidiu atalhar pela outra quadra para lhe encontrar vindo de frente, pois de nada adiantaria estar chamando sem ser visto. Assim que o viu vindo em sua direção, indagou:

- Moço o senhor não estava ouvindo eu lhe chamar?
- Mas é claro que ouvi – Respondeu o coveiro calmamente, ajeitando chapéu na cabeça.
- E por que o senhor não respondeu?
- Moço, aqui dentro eu não respondo a nenhuma voz, só se eu olhar assim, cara a cara!
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Sinto-me um privilegiado e grato por ouvir tantas histórias dos amigos, que me escrevem ou ligam, sabendo as palavras caminham.

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