O BATIZADO

O BATIZADO.
(Aymoré Alvim. AMM, APLAC, ALL).

Curralzinho é um lugarejo que até a criação do município de Presidente Sarney pertencia a Pinheiro. No início do século passado, procedente do Ceará, chegou por lá o senhor Marçal Rodrigues, onde se casou com dona Naíde e teve uma grande prole. Comprou terras, plantou cana-de-açúcar e instalou um engenho do qual obtinha o mel, o açúcar e a cachaça. Atualmente, pertence aos seus herdeiros.

Católico, erigiu uma capela dedicada a São Francisco, cuja festa mandava celebrar todos os anos com grande pompa, no dia 4 de outubro.

Creio que foi em 1956. Seminarista, fui a Pinheiro, nessa época, resolver alguma coisa que não lembro. O pároco, padre Fernando Meloselli, pediu-me para acompanhá-lo em desobriga ao Curralzinho onde ia celebrar a festa do padroeiro do lugar. 

Chegamos um dia antes, no final da tarde. Após o banho e o jantar, conversar e dormir. Nada de festas, claro.

Acordamos cedo. Uma farta mesa já havia sido preparada por dona Naíde com bolos variados, ovos, mingau, leite, chocolate e café. Em seguida, fomos para a capela. Muita gente, calor intenso. Após a missa, os batizados. Muitas crianças de todas as idades e tamanhos. Uma choradeira danada.

Realizados os batizados, quando estávamos saindo para a casa da dona Naíde a fim de descansar e aguardar o banquete da festa, entra um grupo meio apressado que foi falar com seu Marçal. Seu Ludígero queria que o compadre, dono da festa, falasse com o padre para batizar sua neta, pois não deu tempo do pessoal chegar na hora marcada.

O padre pareceu meio aborrecido, mas aquiesceu ao pedido formulado. Assim, retornamos à capela.

- Nome da criança, perguntou o padre.
- É Durvalina, sim, senhor.
- Não batizo. Não é nome de santo.
- Padre, o nome da menina é mistura dos nomes do pai e da mãe dela. Durval mais Lina.

Mas eles não são santos. Como, então, vai ficar?

Após algumas altercações, o padre sugeriu Maria Durvalina.

- Tá certo, seu padre. A gente quer é o batizado.
- E os padrinhos?
- São esses aqui, meus netos, Raimundinho e Florzinha. Já fizeram a primeira comunhão com o senhor, no ano passado.
- Mas não podem. São muito jovens.
- Então, padre, só se for eu e a mulher.
- Nome completo?
- “Ludigéro”, seu criado.
- O nome todo, Ludígero,
- É Silva. “Ludigéro” Silva.
- E a madrinha?
- Amância Costa.
- Não são casados? Não podem.
- Nós somos, seu padre, Nós casamos aqui, na Igreja do compadre.
- Então, é Amância Costa Silva.
- É sim, padre, sua criada, respondeu-lhe dona Amância.

Por fim, foi iniciado o batizado. Nesse tempo, toda a liturgia da Igreja era em latim. Somente após o Concílio Vaticano II, 1962/1965, houve as mudanças como temos, atualmente.

A certa altura, após a Imposição das mãos, o padre fez a Imposição do sal.

- Maria Durvalina, “áccipe sal sapienciae”...(recebe o sal da sabedoria...).

Nesse momento, a menina cuspiu.

- Limpa a boca dessa menina, ordenou o padre.

Ludígero limpou e provou.

- Ah! Seu padre, botaram foi sal, no seu vidrinho. Foi por isso que a bichinha estranhou.
- Ludígero, presta atenção e não atrapalha.

Dando andamento ao batizado, teve início a Profissão de fé. Mas antes havia a Renúncia a Satanás.

- Maria Durvalina, “abrenúntias Sátanae”? (renuncias a Satanás?).
- Diga seu Ludígero: “Abrenúntio”, (renuncio), disse-lhe.
- O que, sô?
- Somente diga.
- Tá certo: “Brenunce”...
- Maria Durvalina, “credis in Deum Patrem”...(crês em Deus Pai...)
- Fale, seu Ludígero: “credo” (creio), disse-lhe.
- Credo, por que?
- Não pergunte nada, seu Ludígero, apenas diga “credo”, recomendei-lhe.
- “Credis in Jesum Christum”...(crês em Jesus Cristo...).
- “Credis et in Spiritum Sanctum”....( e crês no Espírito Santo...).
- “Credo”.
- Maria Durvalina, “vis baptizari”? (queres ser batizada?)
- “Credo”.
- Não é creeeeeedo, bradou o padre. É “volo” (quero). Aymoré, orienta esse energúmeno como responder.
- Não é “ nergumes,” seu padre, é “Ludigéro”. Mas essa fala é muito difícil. Uma hora é pra dizer uma coisa, outra hora é outra.
- Pois, então, presta atenção. Vou perguntar de novo.
- Maria Durvalina, “vis baptizari”. (queres ser batizada?).
- Ela veio sim, senhor.
- Assim, não dá.
- Diga “volo”, seu Ludígero. Orientei-o, novamente.
- “Volo”. (quero).

Concluídos os atos finais, padre Fernando terminou o batizado de Maria Durvalina. O calor era insuportável e a fome era demais. Ufa! Credo

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